14/02/2014

A DECISÃO DO DESEMBARGADOR INFORMANDO QUE A OBAL NÃO É LEGITIMA COMO AUTORA

Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 2014.006592-0, de Barra Velha Requerente : OBAL - Organização Barra Limpa - Amigos de Barra Velha Advogado : Dr. Percival Teixeira de Abreu Filho (98458/SP) Requeridos : Prefeito Municipal de Barra Velha e outro Relator: Des. José Volpato de Souza

DECISÃO MONOCRÁTICA
           Organização Barra Limpa - Amigos de Barra Velha - OBAL ajuizou ação direta de inconstitucionalidade em face das leis municipais que alteraram os valores do Imposto Predial e Territorial Urbano - IPTU, do Município de Barra Velha.
Alega, em resumo, que: a Lei Municipal n. 1.317 e Lei Complementar n. 160, ambas de 4 de dezembro de 2013, modificaram dispositivos da Lei Complementar n. 11/2001, referente ao IPTU; estas normas geraram aumento exacerbado do tributo, superior à inflação; não há critério para justificar essa majoração; houve alteração na base de cálculo, culminado em aumentos que variam de 112% a 1.600%; princípios constitucionais estão sendo violados; as leis, como aprovadas, geram uma "injustiça fiscal"; os requeridos justificam os valores implantados na aprovação que tiveram sobre o assunto por comissão composta de corretores da cidade, engenheiro especialista em avaliação imobiliária e vereadores. Teceu comentários sobre preceitos constitucionais e infraconstitucionais que teriam sido desrespeitados e afirmou a sua legitimidade para propor a presente demanda. Pleiteou o deferimento de medida cautelar para suspender as leis e, ao final, a procedência dos pedidos iniciais (fls. 2-51). É o necessário relato.
 DECIDO.
 Inicialmente, é de se analisar a legitimidade ativa da autora para propor a presente ação direta de inconstitucionalidade, uma vez que o rol inserido na Constituição Estadual é taxativo, o qual transcrevo para melhor examinar a questão, in verbis:
Art. 85. São partes legítimas para propor a ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo estadual ou municipal contestado em face desta Constituição:
 I - o Governador do Estado;
 II - a Mesa da Assembleia Legislativa ou um quarto dos Deputados Estaduais;
 III - o Procurador-Geral de Justiça; IV - o Conselho Secional da Ordem dos Advogados do Brasil;
V - os partidos políticos com representação na Assembleia Legislativa;
 VI - as federações sindicais e as entidades de classe de âmbito estadual;
 VII - o Prefeito, a Mesa da Câmara ou um quarto dos Vereadores, o representante do Ministério Público, a subseção da Ordem do Advogados do Brasil,
os sindicatos e as associações representativas de classe ou da comunidade, quando se tratar de lei ou ato normativo municipal (grifei).
A autora sustenta a sua legitimidade com base no inciso VII do art. 85 da CESC citado, porém esse entendimento não pode ser mantido.
Do seu estatuto extraio que a requerente é "uma organização não governamental, para fins não econômicos, de natureza privada, sem fins lucrativos, político partidários e religiosos [...]", cujos objetivos estão descritos nos incisos I a XVI do art. 1º daquele, colacionado à fl. 52, e que se enquadraria na condição de associação.
Contudo, essa afirmação não pode prosperar, porque é cediço que a associação apta a ter legitimidade para propor ação direta de inconstitucionalidade deve, desde o seu nascedouro e como função institucional, atender ao interesse geral, ou seja, na espécie, a autora deveria ter por primazia a defesa dos interesses de todos os munícipes de Barra Velha, situação que não é verificada de forma clara.
 Isso é observado da simples leitura do inciso XVI, art. 1º, do Estatuto da autora (fl. 52), do qual se extrai como objetivo a defesa dos "interesses dos sócios na preservação de seus patrimônios materiais e imaterias contra agentes públicos, seus concessionários e/ou terceiros através de núcleo específico".
 Denoto que, apesar de o estatuto prever outros objetivos, o interesse de representação, na essência, está direcionado para os sócios, o que não se enquadra na característica de representação geral, apta a abranger todos os beneficiados com a declaração de inconstitucionalidade da norma, que é exigida para o ajuizamento da presente lide.
Não bastasse isso, é de se transcrever mais dois dos objetivos da autora, a saber (art. 1º):
 III - acompanhar e divulgar ações judiciais envolvendo agentes políticos do município; [...]
 VII - promover ações de promoção da probidade, da ética, da cidadania e dos direitos humanos, principalmente junto à criança e ao adolescente (destaquei).
Entretanto, mesmo que fosse feita uma interpretação extensiva do conceito de "associação" inserido na parte final do inciso VII do art. 85 da CESC, é forçoso concluir que não haveria qualquer modificação do posicionamento até então assentado, porque, da simples leitura dos incisos transcritos, concluo que a autora não possui legitimidade para representar os munícipes de Barra Velha em demandas deste gênero, porquanto pode promover, tão somente, ações que se enquadrem na hipótese do VII, pois o inciso III faz menção a divulgar, ou seja, dar publicidade.
                Não desconheço da atual situação criada pelo poder público vinculada à cobrança, de maneira demasiada, do IPTU, porque está se repetindo em diversos municípios do Estado de Santa Catarina, porém a ação direta de inconstitucionalidade possui peculiaridades que devem ser observadas para o seu trâmite, incluindo, o rol de legitimados que, como dito alhures, é taxativo.
 A autora, ao pleitear a declaração de inconstitucionalidade em abstrato das leis mencionadas na peça exordial, deveria "demonstrar interesse na aludida representação, em relação à sua finalidade institucional" (LENZA, Pedro, Direito Constitucional. 12ª ed. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 186), o que deixou de fazer, pois "amigos de Barra Velha" está longe de configurar a representação de todos os munícipes, tanto que, como mencionado em linhas anteriores, os sócios têm direitos pontuais defendidos pela autora, situação que não é estendida a todo o restante da população.
Por oportuno, colaciono o seguinte julgado do Supremo Tribunal Federal:
 AGRAVO REGIMENTAL EM AÇÃO DIRETA DE-INCONSTITUCIONALIDADE. 2.-ASSOCIAÇÃO. ILEGITIMIDADEATIVA. [...] 3. A VERIFICAÇÃO DOS REQUISITOS PROCESSUAIS PARA A PROPOSITURA DE AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE NÃO CONFIGURA INGERÊNCIA ESTATAL NA ORGANIZAÇÃO DE -ASSOCIAÇÕES -CIVIS. 4.-ASSOCIAÇÃO-QUE NÃO REPRESENTA UMA CLASSE DEFINIDA. FUNDAMENTO DA DECISÃO AGRAVADA NÃO IMPUGNADO, O QUE IMPLICA O NÃO PROVIMENTO DO AGRAVO REGIMENTAL. PRECEDENTES. 5. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO (ADI 3606 AgR / DF - DISTRITO FEDERAL, AG.REG.NA AÇÃO DIRETA DE-INCONSTITUCIONALIDADE, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, julgamento:- 02/08/2006).
 Diante deste contexto, indefiro o pedido inicial, com base nos arts. 295, inciso II e 267, incisos I e VI do Código de Processo Civil, e declaro extinto o presente feito sem análise de mérito. Arcará a autora com as custas processuais. Intime-se. Publique-se. Após, arquive-se. Florianópolis, 7 de fevereiro de 2014.
José Volpato de Souza RELATOR

Gabinete Des. José Volpato de Souza

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